domingo, 23 de novembro de 2014

O Sobradinho dos Pardais ( resenha)



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SALES, Herberto. O Sobradinho dos Pardais. ed 31, São Paulo: Melhoramentos, 1994.


     Herberto Sales (1917 – 1999) baiano da cidade de Andaraí, Chapada Diamantina, estreou na literatura aos 27 anos de idade, com o livro Cascalho, que o despontou para o mundo. Jornalista, contista, romancista e memorialista é autor de várias obras  premiadas. Pertenceu a Academia Brasileira de Letras e traz uma escrita acadêmica muito forte e notável.
Entre os vários títulos para o público adulto como Além dos Marimbus A prostituta, Rebanho de  ódio, Cascalho, A telha que falta entre outros,  o autor também se  destacou na literatura infantil como A feiticeira de Salina, O casamento da raposa com a galinha, O homenzinho dos patos, O burrinho que queria ser gente... No entanto é em O Sobradinho dos Pardais que esse escritor baiano brinda à vida com essa brilhante história infantil.
     O que uma história infantil tem de especial? Ela como todos os livros desse baiano tiveram dezenas de publicações e traduções em vários idiomas, só esta editora paulista( dessa edição analisada) fez aproximadamente umas dez edições desse livro. Isso já nos revela a grandiosidade dessa história contada por um baiano, mundialmente conhecido e praticamente um estranho em seu espaço.
     Espero está a altura para descrever o conteúdo desse livro que traz uma simples história de um casal de pardais, protagonistas da narrativa.  Dona Pardoca e Sr. Pardal. Esse casal sempre viveu na mata, livre, feliz. Os pardais tinham como afilhado o filhote de Dona Joaninha-de-barro. Mas, não estavam preparados para a chegada dos próprios filhotes. Ao aproximar o inverno Dona Joaninha ao ver sua comadre na chuva e ela bem confortavelmente acomodada em sua casa, aconselha a procurar uma moradia fixa. Preferencialmente em um beiral de alguma casa.
     Surpresa, o mundo que Dona Pardoca conhecia era a mata, nem sabia o que era beiral, muito menos o que era uma casa.  Quando Sr. Pardal chega, ela logo se entusiasma para falar sobre deixar a mata. Ela queria conhecer beirais. Ela queria conhecer o mundo. Sr. Pardal cauteloso, explica para sua esposa os perigos que existiam fora da mata. Como a cidade reservava várias armadilhas. Porque a cidade era dos homens.
     Não adiantaram os avisos, Dona Pardoca insistia que saindo da mata, seria mais fácil criar os futuros filhotes. E o frio poderia prejudicá-los sem um abrigo adequado. E acaba convencendo o Sr. Pardal que rapidamente decidem partir logo cedo para a cidade dos homens, antes que as chuvas ficassem mais intensas. O que levam? Apenas uma palhinha da mata, para servir de primeira iniciativa para o ninho que iriam fazer bem distante.  Com isso, Dona Pardoca vai correndo se despedir de Dona Joaninha  dizendo que jamais voltaria para aquela mata, onde nem casa ela tinha. Ouviu a advertência da comadre que desejava bastante sucesso, mas nunca se deve cuspir no prato que se come.
     Partiram e ao chegar num sítio encontra um sobradinho desabitado.  E lá fizeram o ninho, tiveram dois filhotes. E a alegria é imensa. O beiral tinha várias janelas, e de lá a família de pardais desfrutam de uma felicidade enorme. A preocupação do Sr. Pardal é que algum homem apareça naquele sobradinho e estrague a felicidade.
     Um dia, Sr. Pardal estava no sítio, pois já estava  observando a área para caso, surgissem moradores, já pensar em outro lugar. E não percebe que em seu sobradinho alguns homens entraram. Já Dona Pardoca, ao ouvi o barulho fica admirada com aqueles dois seres diferentes em sua residência. E para dá as boas vindas, canta  bem bonito. Coisa que irritou um dos homens, ao olhar para cima e vê-la voando baixo entoando uma linda canção. E de imediato, um dos homens deixa a ordem para tapar todos os buracos do forro, pois não queria saber de pardais  na sua casa.
     Dona Pardoca como não entendia a língua dos homens, achou que agradou os novos visitantes. E foi tranquilamente descansar  com os seus filhotes, enquanto o Sr. Pardal estava ausente. E para sua surpresa, recebe uma barrofada de massa de cimento que só teve tempo de correr por instinto materno para proteger seus filhos.  Fica desesperada por conta dos pequeninos, pois choravam, sem condições de voo. Ela ao carregá-los para tentar escapar pela outra janela, nova massa... Escuridão total.  Pensou na liberdade da mata.
Ao retornar alegre com a descoberta de um novo beiral,  Sr. Pardal não encontra uma janela do seu sobradinho aberta, todas foram lacradas com aquela massa. Ele arranhava, piava, chorava desesperado... Sem nada poder fazer. A  cidade era dos homens. O seu lamento não iria salvar vidas. E foi no desespero ele se conscientizou. E passa a comunicar com sua amada, pedindo calma. Enquanto ela dizia: "não temos solução, fecharam as nossas janelas!"  Sr. Pardal passa a olhar para todos os lados, de repente se lembra de uma velha goteira, por conta de uma telha quebrada. E desesperado ele se direciona para lá, apreensivo, torce para que os homens não tenham percebido a brecha na telha. Para seu alívio, estava no mesmo lugar. E com sacrifício ele passa a chamar a sua amada para aquela pequena abertura, e guiada pelo som da sua voz ela com os filhotes seguem. E assim, daquela pequena abertura Sr. Pardal salva toda a família, juntos retornam para a mata.
     Vejo esse texto como um hino à vida, à persistência, um brinde ao amor.  O pardalzinho consegue ensinar a ter força diante dos obstáculos. Por mais que eu tente transmitir o sentimento que exala de um texto como esse, não tenho essa competência. Quantos de nós desistimos quando encontramos as portas travadas?  Quantos de nós jogamos a toalha nas primeiras críticas?  Quantos de nós já fomos ridicularizados pelo sistema nesse jogo de vale tudo para se aparecer ou derrubar o próximo?  E o que fazemos? Como esse pardalzinho direta ou indiretamente nós construímos outra morada. Buscamos novos abrigos. Às vezes das brechas, das margens, da lama... E assim como Sr.  Pardal e Dona Pardoca nós também brindamos a vida. Às vezes as conquistas são minúsculas para os gigantes, mas para nós, escritores e escritoras aprendizes, meros pardaizinhos no mundo dos homens,  cada leitor conquistado é uma vitória comemorada.

                     Obrigada pela leitura e excelente final de semana!

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                                    Bahia/2013
 
                                                                                                 Elisabeth Amorim

* imagem da web.

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