O livro MULHER NO ESPELHO é da
autora baiana da cidade de Salvador, HELENA PARENTE CUNHA. Lançado em 1985 o
livro chama a atenção pela forma que foi conduzido todo o seu enredo. Sendo que é protagonizado por uma MULHER NO
ESPELHO que trava uma grande batalha com
o seu duplo refletido, pois uma não reconhece e nem valida as ações da outra,
bem como a mulher que a escreve, no caso a autora. Pois a Mulher no Espelho
fala o quanto ela queria falar e a autora resistiu criá-la, dar-lhe voz. E
quando isso acontece, ela perde o controle sobre o personagem.
Mulher no Espelho achava que
tinha uma vida tranquila, pois abdicou de todos os seus sonhos por conta da
instituição familiar. Onde o esposo trabalhava no espaço público e ela ficava
confortavelmente o esperando em casa, se preparando para essa chegada. Pois
precisava agradá-lo. Até que ela para
diante do espelho... E o seu mundo tão bem construído veio abaixo. E o livro
inicia “E vou começar a minha história. Agora na superposição dos meus rostos,
em convergências de datas. Aqui, no cruzamento do meu corpo com o espaço de
minhas imagens. Tenho que dizer-me a mim mesma...” p. 3
O seu duplo começa a mostrar as
coisas que ela abriu mão. Como ela estava cada vez mais invisível diante dos
seus familiares, naturalizando cada violência sofrida seja pelo marido ou pelos
filhos desajustados socialmente, ela buscava uma justificativa. E passa a mostrar que todos os sacrifícios
dela foram em vão. Pois nenhum deles (esposo e filhos) a respeitavam . E começa a mostrar como ela foi ingênua em
acreditar que a anulação era necessária para um casamento feliz. O duplo cobra
uma reação de Mulher no Espelho, pois o esposo a traía até com a empregada,
dentro do próprio “sagrado lar”, os filhos estavam no caminho da perdição, usuários de drogas, inda para prisão.
Ela não passava de uma grande farsa.
Mulher no Espelho se desespera
com a conversa com o seu duplo, vez ou
outra acusava a autora por colocá-la naquela situação, mas
não tinha jeito, tinha momento que ela tentava jogar o resultado dos seus fracassos para a autora, mas o seu duplo à sua frente,
obrigava ela assumir as suas culpas e os seus ódios. Enquanto ela permanecia em frente ao espelho,
a “outra” não dava trégua. Fala das
repressões sofridas, a sexualidade anulada, dos medos de fracassar como mãe,
esposa como algo infundado, pois ela já havia afundado e nem ela sabia. Veio
descobrir-se diante de espelho.
Cada vez mais Mulher no Espelho
percebe que a mulher que estava do outro
lado era livre, solta, fazia o que tinha vontade, dona do próprio corpo. Era ela às avessas, pois
acorrentada à instituição família foi se deixando apagar para manter as
aparências, até que surgiu aquela paradinha diante do espelho. Como ela encontrava-se apática, sem
disposição para a mudança, tenta justificar-se a atitude atual aos problemas do passado. Os
ratos que roíam os pés, o irmão que
dividiu o quarto e dividiu a atenção dos pais e a mulher que demorou
muito resistindo aquela escrita que a
obrigava aquele mergulho no fundo da alma.
Do outro lado do espelho, a outra
obrigava-lhe a refletir e assumir as próprias falhas. Uma delas foi a vontade
de afogar o próprio irmão na cisterna por
ter se tornando o centro das atenções da família e ela ter perdido o colo dos
pais. Quando o duplo fala sobre isso,
Mulher no Espelho se revolta, e acusa: “ a mulher que me escreve deturpa os
fatos... A mente da mulher que me escreve é lodosa e suja... Eu nunca desejei
matar ninguém...” p. 47.
Em sua luta da personagem consigo
mesma, faz Mulher no Espelho retomar a uma noite fatídica em que alguém
desesperadamente bate à sua porta. Ela reconhece a voz exaltada do filho mais
novo. Entediada, resolve não abrir, pois poderia estar drogado. Deixa-o do lado
de fora, fora do seu mundo. No dia seguinte percebe que um jovem de família tradicional
morre para defender a reputação da mãe. E o remorso toma conta da Mulher no
Espelho e finalmente ocorre a junção entre ela e a mulher que a escreve. Unem-se pela dor da perda. Em suas palavras:
“Acabou. Percorremos nosso
caminho até o último passo. Agora estamos paradas, uma olhando para outra, os
pés roídos de ratos. Os espelhos se multiplicam as imagens até o infinito. Mas
nosso remorso nos une... Ela sou eu. Eu
sou ela. Somos apenas uma...” p. 132.
Realmente, os espelhos se
multiplicaram, com ajuda de um raio, os pedaços foram ao chão, dando-lhe a
chance de pegar um pedacinho para encontrar-se consigo mesma naquela imagem ou
se perder no mundo das memórias.
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