terça-feira, 4 de abril de 2017

Negrinha ou Moreninha? ( crônica)


                                        
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De repente, lembro-me que nem olhei para o espelho hoje. Volto correndo e dou aquela paradinha... observo algumas rugas, paro diante dos olhos graúdos, pretos, a pele apresenta uma cor meio marrom, castanha, negra. Será que negrinha não fica melhor?
Como o povo resiste diante da cor da pele, busca tonalidade mais amena. Para não dizer que negra, escura ou preta cria sinônimos adjetivados, “marronzinha”, “moreninha” ou até  um “negrinha”, cairá melhor, o sufixo “inha” da negra dá uma suavidade que a pele precisa.  Sei, não...
Isso é o que pensava aquela mulher negra que para extasiada diante da sua sobrinha com apenas dois anos de idade.  A criança tinha uma beleza exótica, olhos expressivos,  o cabelo totalmente indomável sobre uma tiara colorida, simplesmente uma criança linda. E sem perda de tempo  a tia aproxima-se  da garotinha e diz:
- Minha negrinha linda, venha dá um abraço na titia!  
Antes que a criança obedeça,  surge uma mãe furiosa e grita:
- MARIA, FALE O SEU NOME PARA SUA TIA!  Aproveite diga a ela que você não é negra, mas moreninha!
Negrinha ou moreninha?  Por mais que falemos que não devemos julgar pela cor da pele, confesso que uma situação como essa merece essa crônica. Até que ponto vai os nossos preconceitos? Desde cedo uma mãe ensina para a filha que ser negra era algo feio, precisaria de um termo mais ameno, certo?  Lamentável essa não aceitação da etnia, talvez até uma forma de autodefesa por conta dos preconceitos futuros.
Por outro lado, a atitude da tia, mesmo inconsciente, está impregnada de preconceito também. Será que se a sobrinha fosse branca ela chamaria “Minha branquinha linda?” Por que para a negra/ o negro precisa desse reforço?  Se você busca a biografia de um escritor  como Machado de Assis, Lima Barreto, está lá “mestiço”, “negro” e a biografia de um escritor branco, por que não aparece “branco”?  Por que para o negro precisa desse  reforço?  A fotografia ou própria pessoa por si já não escancara a negritude na pele?
Cresci enxergando-me morena, porque a sociedade, família e entorno me viam assim. Apesar do registro aparecer uma cor “parda” que até hoje não consegui identificar o que é mesmo ter a cor parda?  Ainda bem que depois de adulta, tive tempo de revisitar o espelho... Moreninha, eu?
                                             
                                 E. Amorim

*Izabel Pariz, A mulata e a gata.



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