segunda-feira, 1 de junho de 2015

A PORTA ( crônica)



De repente, uma porta. Lembrei-me de uma professora da infância que  levava para sala um poema (naquela época achava ridículo) sobre a porta. E era um tormento fazer aquela leitura mecânica: “Sou feita de madeira/ Madeira matéria morta/ Não há coisa neste mundo/ Mais viva do que uma porta”. Ficava com os meus botões... Será que esse tal de Vinícius não tinha um assunto melhor para escrever? Que porta mais sem graça!
A minha birra com “ A porta” era por conta da condução da leitura. Imagine uma sala com 35, 40 alunos seguindo esse ritual: cada um lia o poema em voz alta, enquanto a professora ficava lá à espreita, como uma porta para impedir  ou escancarar nossos tropeços.  Eu queria declamar ou recriar aquele poema,  mas isso não fazia parte do roteiro. Então ficava contando as horas para chegar a minha vez e ficar livre daquela porta: “...Eu abro devagarinho/ Pra passar o menininho/ Eu abro bem com cuidado/ Pra passar o namorado... Eu abro de supetão/ Pra passar o capitão.”
Hoje, tanto tempo depois, vejo-me diante de algumas portas. Fico a imaginar como  faço para atravessá-las? Será que preciso agir como “um menininho” para que elas se abram devagarinho ou assumo o lugar de “um namorado” para que as portas se abram com cuidado?
Essa crônica surgiu como uma forma de agradecimento a todos os  queridos leitores que gentilmente me procuram em diferentes espaços virtuais  e  entram  em meu mundo literário,  atravessam a minha porta.  Como escrevo por prazer,  deixo- a aberta ou encostada  para  qualquer  pessoa que goste  (ou não)  de literatura das margens possa livremente entrar, ler, criticar, sugerir, interagir, desmontar...   Às vezes sou o que escrevo,  vivenciando cada verso, parágrafo, lágrimas, dor, alegria, prazer, felicidade ou tristeza,  mas nem sempre o que está escrito sou eu ou minha biografia, afinal “O poeta é um fingidor...”
Reconheço as portas que erguemos. Por precaução ou segurança não podemos escancará-las, mesmo porque a vida fora dessa virtualidade  prossegue acelerada. No entanto, ao fecharmos a porta pelo lado de dentro, não  notamos quem está no batente. Ficamos presos entre uma madeira e a chave.   A literatura já foi vítima de tantas portas fechadas por conta da canonização dos “bons” em detrimento da anulação de outros que nunca saíram dos velhos baús. Até quando a prisão? 
  
É isso poetas, escritores, leitores, aprendizes, simpatizantes ou curiosos...  obrigada por levar-me  até seus espaços literários.  Que essa porta permaneça aberta para a interação  e fortalecimento da literatura em rede...      
  Finalmente, nos versos finais de Vinícius de Moraes percebi o quanto as  portas revelam:   “Eu sou muito inteligente/ Fecho a frente da casa/ Fecho a frente do quartel/ fecho tudo nesse mundo/ só vivo aberta lá no céu”.
Antes do céu... Que tal olhar quem está batendo à porta? Se for o bem, deixe-o entrar e divulgue-o!

  
                                    Elisabeth Amorim

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