Observando o luxo da ornamentação natalina de um shopping nos seus 30 anos de existência, a quantidade de ursos de pelúcia de todos os
tamanhos, jeitos... mexem com a imaginação dos consumidores mirins que ali aparecem
com seus pais em busca do presente de Natal.
Sentei-me discretamente e passo a analisar as pessoas a minha
volta. Cada uma com objetivos diferentes, algumas com muitas sacolas, outras a
pesquisa de preços, mas de uma forma ou de outra, todas passam pela praça de
alimentação, sentam-se e saboreiam
o sorvete gigante com as frituras do dia, apesar de se queixarem da
dieta não surtir efeito. Rio sozinha no
meio daquela multidão faminta.
Não demora muito chega quem eu esperava. Estava a procura de
alguém diferente, e meu desejo foi realizado. Uma mulher, a primeira vista,
totalmente inadequada, ela não tinha mais que 30 anos, roupas surradas, pele
escura, acompanhada de duas crianças também desarrumadas, uma com
aproximadamente 7 anos e a outra dando os primeiros passos, não tinha mais que
um ano e meio. Acompanho com o olhar
cada passo daquela mulher de cabelos crespos despenteados. Percebo que andava
lentamente, com uma mão segurando a barriga, como se sentisse alguma dor
estomacal, ou talvez tivesse passado por
um processo cirúrgico recente. Circulava entre as mesas na praça da alimentação, como
se estivesse também a procura de alguém,
várias vezes nossos olhares se cruzaram e desviamos rapidamente.
No entanto, ergueu o queixo e andou firme até uma mesa
vizinha. Fala algo tão baixo que tentei ouvi-la, sem sucesso. Os senhores ouvem
atentamente, pegam um guardanapo e dividem a pizza com ela, agradecida passa
para o outro lado da praça de alimentação.
A mulher solta a mão
da criança menor, e em companhia da outra mais velha, senta-se tranquilamente,
reparte a pizza doada e comem. Enquanto elas comiam, eu ficava a questionar: Por que
ela deixou a menina pequenina solta no shopping? A refeição termina, a mulher se levanta,
espicha o pescoço para um lado e para o outro a procura da sua filha perdida,
por alguns minutos ela desaparece, ao reaparecer no campo da minha visão já com
a criança no colo, andando lentamente com suas duas crianças em
direção a outra mesa, antes, porém, para diante de mim, olha-me profundamente
por alguns segundos e segue sem pronunciar uma palavra, mas o olhar
ficou gravado.
E na festa dos 30 anos
do shopping, ela estava lá, acorrentada à sua pobreza, porém comendo, bebendo das
sobras adquiridas. Meu Deus! Nem todos que estão num shopping sentem a
mesma fome. De repente, as luzes do lugar perderam o brilho diante daquele
olhar, como se ela tivesse o dom de acordar o espírito natalino que habita em
mim.
E. Amorim
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