Elisabeth Amorim
É
muito estranho você ouvir, ler ou até mesmo repetir uma ofensa a alguém
atribuindo a essa pessoa características da cultura, culinária de determinada
região. E soa mais estranho quando você substitui o alvo da ofensa por um ou vários personagens criados pelo
mesmo. Fico a matutar com esse meu jeito baiano de ser, e resolvo entrar no
clima para vê como ficaria brigar com o meu amado Jorge. Acredito que faltaria
criatividade para conseguir atingi-lo de fato e de direito, mas mesmo
assim tão baiana quanto ele, vou fazer
essa experiência...
De
cara, chamaria de “Pedro Bala”. Por quê?
O homem conseguiu furar o bloqueio, fronteira e ninguém mais o
segurou. Ele foi bem mais que o líder
dos capitães da areia, capitaneou a literatura baiana com a maestria sem igual.
Só sendo o “Pedro Bala” para mostrar para o mundo o submundo das crianças de
rua, menores abandonados descritos como poetas da cidade de Salvador, Bahia.
Bem, acredito que Jorge não ficaria nem um pouco chateado com esse apelido...
Então como não consegui irritá-lo, tenho que buscar outro. Qual?
Acredito
para ofendê-lo de verdade, é só chama-lo
de “Quincas Berro D’água”. É isso, Quincas! Porque trocar o nome de Jorge pelo
de “Quincas” de certa forma estava
chamando de “cachaceiro”, “ boêmio”, “
irresponsável” ... Qual o homem que almeja esse rótulo? Com certeza esse é o olhar ingênuo para o
“Quincas”. Um olhar mais maduro poderia
vê-lo um homem determinado que não aceitou a hipocrisia da sociedade
representada pela própria família com ar burguês e joga para o alto, vivendo a
própria vida. Quincas é um ex-Joaquim que tem a “morte” anunciada
quando rompe com os laços familiares. Essa morte sentimental faz renascer um novo homem. É... Chamá-lo de “Quincas” o máximo que conseguiria dele
era uma bela gargalhada, e perguntaria com um berro: _ É água!
Bem,
se dois nomes de personagens masculinos não adiantaram, o jeito apelar para a
sua personagem mais famosa: É isso, já
vem a “Gabriela”! Qual o homem que gostaria de ter seu nome trocado por um nome de mulher? Acho que
nenhum que eu conheça... Aliás, “Gabriela” depois de Jorge Amado, passou a ser
símbolo de mulher forte, determinada, e
consequentemente marca de vários produtos na região Sul da Bahia. Estranho,
não? Tem algo nessa história que não bate. Como pode uma mulher “vadia” como a
“Gabriela” receber tantas homenagens?
Vivemos em uma sociedade patriarcal, as mulheres ainda hoje, são vistas de esguelha quando
desempenham uma função diferente da convencional. Mas, voltemos a “Gabriela”. Que raio de
mulher foi essa que depois da publicação
do livro de Jorge Amado aumentaram a quantidade de nomes em sua
homenagem?
Novamente
entra em cena o olhar ingênuo para a literatura e um olhar mais crítico. No
segundo olhar, nota-se na personagem uma raça, determinação que ia de encontro
a todos os costumes da época. Em nenhum momento está aqui defendendo a traição,
adultério. Não é esse o ponto em questão, mesmo porque se a “Gabriela” fosse a
prostituta que muitos olhares ingênuos apontaram inicialmente, será que a
sociedade iria homenageá-la com nomes de produtos, empresas de turismo, filmes,
seriados e ser traduzida para mais de quarenta países? Com certeza, não!
“Grabriela” passou por um casamento forjado por Nacib e cia na vã tentativa de domesticá-la para uma
sociedade impregnada de preconceitos e podridão, como exemplo, o que a Sra. Sinhazinha (alta sociedade)
fazia às escondidas com o dentista não diferenciava do que Gabriela fazia com
mais liberdade...
Então,
trocar o nome de Jorge Amado e chamá-lo de “Gabriela” acredito que seria mais
uma homenagem a esse escritor. Afinal, é o romance mais lido, discutido,
polêmico que a Bahia presenteou para o
mundo literário. E nem vou dá o trabalho de tentar agredi-lo chamando de “Dona
Flor” ou até “ Tieta” porque conheço as
histórias dessas mulheres de Jorge... O mínimo que conseguiria é fazer com que
a “Rosa Palmeirão” mostrasse a faca que guarda sob a saia por estar tentando
diminuir um trabalho de alguém.
Como
já percebi que não abalaria o meu querido Jorge Amado em nada trocando o seu nome por uma das suas personagens, recorro-me a falta de criatividade e vou
atacá-lo usando uma comida típica da região, mesmo porque ele gostava de evidenciar
a culinária baiana em seus livros... E
quando percebo a sua presença, grito:
_
Acarajé! Acarajé!
Jorge
Amado, grande escritor baiano da cidade de Ilhéus, fã de carteirinha da grande
Salvador, para alguns minutos para melhor ouvir os meus berros:
_Acarajé!
Acarajé!
E
com sorriso nos lábios, com uma inteligência peculiar da região, responde:
_
É da Bahia?! Com camarão e pimenta, por favor!
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*Produção de 2013, resposta a um escritor/leitor que só referia a mim, usando nome de meus personagens, como " Dendê", por exemplo, ou comida típica da Bahia. Não sabendo ele que tenho orgulho das minhas origens. Sou um pedacinho da arte baiana. Não me conhece? Prazer, leia meus textos, passará a me conhecer.