Fala-se muito em respeitar as limitações do outro, inclusão, educar para transformar, mas, muitas vezes só os discursos teóricos acontecem. E o dia termina, o ano letivo também… no travesseiro a interrogação: o que foi feito para abraçar o outro com suas limitações e diferenças?
Estudantes da 3ª. série do Ensino Médio de uma escola pública no interior da Bahia, diariamente, dão exemplos práticos de inclusão, mostram como fazer a diferença numa sociedade tão igual, massificada. Fazer a diferença exige de nós: ética, respeito, solidariedade, companheirismo, cumplicidade… Mas, o que esses estudantes do 3BM da pequenina cidade de Iaçu fazem de tão especial?
Antes, vale repensar nas questões: Como avaliar(ou julgar) quem não fala a sua língua? Como ensinar língua portuguesa a quem não conhece nem ouve os códigos utilizados por você? A primeira reação é “não vou conseguir!” ou reverter a situação : “esse aluno não sabe nada!” Afinal, o que é “não saber nada” na educação? Bem, vamos ao fato, encanto ou literatura… Você decide! A surdez de um aluno (ou minha?) era como uma barreira intransponível para que a informação se transformasse em conhecimento, por isso a primeira unidade foi terrível, porque o aluno não sabia a “minha língua”, o aluno não falava “a minha língua”, o aluno não aprendia “a minha língua”. E desde quando “a minha língua” tem que ser falada por todos?
A ficha caiu: da mesma forma que eu olhava as limitações de alguém, colocava em evidência as minhas também. E isso só foi possível graças a atenção dos alunos da classe para com o colega, incluindo-o em todas as atividades desenvolvidas. Como? Através da exploração das habilidades artísticas do jovem, cada proposta é respondida com muita precisão e arte. E uma pesquisa, por exemplo, era “transformada” em cartaz com auxílio de tintas, pinceis e muita criatividade.
Educar é transformar-se diariamente, quem não se modifica perante as limitações do outro, provavelmente, falta alguma coisa, talvez, a lapidação. A turma do 3ª.BM tinha mais uma missão a cumprir. Encenar a peça teatral “O santo e a porca” de Ariano Suassuna. E no dia da apresentação, mais uma surpresa! Quem estava no auditório caracterizado de Santo Antônio? Um “santo” muito feliz e orgulhoso por ser abraçado de verdade e de forma pública. Isso é inclusão!
Que gesto bonito! Incluir é abraçar, aceitar o outro sem rótulo. E durante todo o percurso desse ano letivo alguns estudantes vem me ensinando a ensinar. Voltando a peça teatral, no final da apresentação, muita aplaudida, por sinal, uma colega de sala pede ao auditório lotado aplausos exclusivamente para um colega que mesmo com limitações, cumpriu muito bem o papel a ele destinado. Um estudante visto como “surdo”, mas para seus colegas e amigos ele tem nome e sobrenome. Acho que no fundo, aquele linda homenagem e aplausos chegaram até o coração do jovem, pois seus olhos brilhavam… Sim, ele ouviu toda a manifestação da plateia, porque todos ouvem, sentem e extasiam quando são abraços.
Às vezes, achamos que já aprendemos muito, mas abraço é ação prática de difícil de execução. E com os alunos do 3º. BM do Colégio Estadual Lauro Farani percebo a luta para tornar a vida de “D” mais fácil, para não deixá-lo do outro da porta, mesmo estando na sala. Porque abraçar os iguais, coligados que falam a mesma língua é fácil, mas abraçar o diferente (longe das câmeras) é gesto nobre de poucos. E essa turma sabe fazer isso com muita propriedade, e o melhor, agora ensinando para o mundo através do nosso toque poético.
Parabéns, meus queridos!
E. Amorim